Como descrever uma viagem no tempo, foi a primeira pergunta
que fiz antes de iniciar esse texto. A resposta eu ainda não obtive, pois
aquilo que nos parece distante e inexistente quando se torna realidade, demora
algum tempo pra ser digerido.
Dia 07 de janeiro pisei em solo Europeu pela primeira vez.
Nem desejava uma viagem dessas, porque no meu imaginário eu jamais conseguiria
um dia estar em um lugar distante do Brasil e o motivo sempre foi questões financeiras
mesmo. Nunca imaginei um futuro brilhante, cheio de riquezas próximas a mim e não
tinha contato com essas manias de desejos sobre coisas de fora, beleza, roupa,
comida, mordomia.
Todavia, para minha felicidade, fomos a Lisboa, eu e o meu
marido. A viagem tinha conexão em Madri e de fato descemos naquele aeroporto
gigante chamado Adolfo Suarez. Precisávamos nos alimentar e paramos numa
lanchonete próxima ao portão de embarque. Tinha suco, pão, muito pão, saladas e
vários tipos de doces. Escolhemos o mais comum, um misto e no momento de pagar,
a surpresa: uma máquina que recebia dinheiro e já dava o troco automaticamente,
sem intervenção humana. Olhamo-nos
assustados, coitados, completos peixinhos fora d’agua, poderia dizer alguém ao
ver a cena. Foi o primeiro impacto, que já anunciava o mínimo com o qual nos depararíamos
nessa viagem.
Tudo parecia encantador, construído com materiais de
primeira qualidade, saguão impecável, limpeza ao extremo, brilho, muito brilho.
O tempo foi curto para mais análises, embarcamos no avião.
A aeromoça agora deixava de falar espanhol, já reconhecia um
aparente português identificável por certo sentido, porém diferente, tanto pelo
sotaque rápido e de esforço atípico, como por algumas palavras desconhecidas.
Olhei a janelinha e podia ver as casinhas brancas e
coloridas lá do alto, muito parecidas com as do Pelourinho, mas com um visual
digno de uma casa bem cuidada.
Estava ansiosa para sair, respirar o ar europeu e quando as
portas se abriram, a sensação do frescor no rosto se eternizou em minha mente.
Consigo parar nesse exato momento e me enxergar de fora, como telespectadora de
uma cena de novela, daquelas bem românticas, em que as jovens parecem estar
eternamente flutuando, era assim, exatamente assim que eu me sentia, flutuando.
Fazia 9 graus, eu não possuía um casaco próprio para o
legitimo inverno e claro, senti muito frio. Se pudesse voltar no tempo, já
teria ido com três tipos de roupas: uma camisa de algodão por baixo, em seguida
algo feito à lã e por fim, um casaco corta vento.
Nosso amigo Mineiro nos recepcionou, senti-me feliz por ter “um
igual” no território a fora. Ele e sua esposa foram responsáveis pelos
direcionamentos mais fantásticos por Lisboa. Mostrou-nos logo de cara como era sair
de um aeroporto diretamente para o metrô ou metro sem acento como dizem os
nativos.
Fiquei preocupada com a mala, imaginando que as rodinhas não
iriam aguentar passar pelas calçadas, os paralelepípedos nas ruas, os
desnivelamentos... Nada, nada disso. Calçadas lisas compostas por um tipo de
pedra portuguesa quase que escorregadia, mas não o era. Ao meu ver, parecia que
cada pedrinha tinha sido cuidadosamente unida uma com a outra, no intuito de ninguém
tropeçar ou sofrer com a falta de alguma delas. As calçadas não tinham divisórias,
aquele espaço no chão era de fato público e não escancaradamente particular
como no Brasil.
Descemos na estação do Baixa Chiado, nome do bairro onde ficaríamos
durante 15 dias. As cores dos edifícios e calçadas me chamaram atenção, era um
tipo bege exuberante, mas com discrição, que combinava perfeitamente com o
clima frio da local e das pessoas. Não se via
muito sorriso como diariamente vejo no Brasil.
Continuamos a andar, e passamos por uma rua cheia de lojas,
marcas famosas, Zara, restaurantes e a famosa estatua de bronze em homenagem a
Fernando Pessoa. Parecia incrível, e como se não bastasse, vejo a bela visão de
uma praça, com um monumento enorme em homenagem a Camões. Sinto que estou no lugar certo.
Desculpe leitor, o exagero de detalhes, mas preciso
registrar cada segundo daquele lugar, pois você visitar um local completamente
diferente da sua realidade, te chacoalha, te deixa um tanto quanto bobo, extasiado,
algo parecido como ingerir uma comida de tempero sensacional e não tomar
liquido a fim de não perder o sabor.
Chegamos ao hotel, de nome Evidencia localizado próximo ao elevador
da Bica. Impressionou-me o lugar pela decoração diferenciada, um verde selva
que se misturava com cinza em forma de papel de parede, mas não era. Na
verdade, uma pintura em lona que revestia as divisórias. Adesivos de gatos
espalhados pela escada, além das estatuas também em homenagem ao animal. Quarto
pequeno, mas extremamente aconchegante; banheiro diferente por conter ducha ao invés
de chuveiro, mas depois descobri que era assim na maioria das casas do lugar.
Chegamos ao final de tarde e já escurecia, era o aviso ou
primeiro sinal de como os dias passariam rápidos em Lisboa. Fomos à primeira
volta como turistas, sem o peso da mala, mas armados com câmeras fotográficas que
capturariam o nosso recorte daquele visual. Muitos flashes, e não paravam,
porque tudo era muito bonito, muito diferente, desigual. Mais uma vez a
necessidade eternizar cada segundo daquele momento.
Jantamos no Chimarrão, uma churrascaria brasileira que servia além de uma picanha maravilhosa, saladas diferenciados, estilo local mesmo.E ficamos surpresos com o valor da refeição, comemos rodizio por apenas 11 euros por pessoa. Surpreendente também o valor do vinho, pedimos uma garrafa, e não saiu por mais que 5 euros. Mais tarde descobriríamos que a gastronomia da região é muito barata e divina.
Depois disso, caminhamos bastante pelas ruas, observamos o Elétrico, um meio de transporte antigo, parecido com um bondinho que trafega pela cidade. Destaque diferencial, ele traz um toque pitoresco a Lisboa, é marca. Não dá pra lembrar das ruas e não vir a mente os trilhos por onde passa, levando a alegria de um amarelo que destoa do pálido bege local.
Contemplamos as árvores sem folhas, levadas pelo inverno, podíamos perceber como de fato se representava aquela estação do ano, já que na Bahia, ela é quase que imperceptível. O tom melancólico da natureza era o que faltava para definir o equilíbrio do ambiente. Incrível, como tudo parece combinar, até mesmo o que não pode ser manipulado pelas mãos do homem.
Logo depois, paramos no Bairro Alto, nossa passagem por lá foi incrível.
Ruas lotadas de pequenos barzinhos, do tamanho de um quarto, mas perfeitamente
decorados, seja em estilo reggae, seja em estilo underground, o clima era de atração,
encanto por todos os lados. Curtimos a noite, mesmo cansados de 12 horas de
viagem. Fomos fisgados por uma jam session, simplesmente, a banda tocava
músicas pop, conhecidas, aí chegava um carinha com uma guitarra arrasando no solo,
horas depois outro com um trompete e assim desenrolava o som. Todos dançando
num ritmo estranho, completamente desconexo, mas de fato encantador.
Fomos dormir quase que três horas da manhã, traduzindo a frase anterior, passamos 24 horas acordados! E por incrível que pareça não existia cansaço. Nossas mentes não paravam de comparar, era exagerado o bem estar que nos fazia aquele local. Acho que nenhuma droga no mundo podia proporcionar o prazer que a cada segundo era injetado em nossas veias só de vivenciar um pouco de Lisboa,
Calma, essa foi apenas a primeira impressão, parece que estou narrando vários dias, mas relatei somente horas de percepção. Vou finalizar esse texto por aqui, pois gostaria de descrever dia por dia, serão muitos capítulos, afinal há muito o que se dizer sobre esta bela cidade.